domingo, 4 de outubro de 2020

MORRE JOÃO CARLOS SAGATIO, O ILUMINADOR DE ANSELMO DUARTE EM "O PAGADOR DE PROMESSAS"

Hoje à tarde, domingo, tomei conhecimento da morte de um grande profissional do cinema brasileiro, que recentemente gravou depoimentos, cerca de um mês atrás, a serem utilizados no meu documentário-tributo "O CENTENÁRIO DE ANSELMO DUARTE", estabelecendo assim, na parte narrativa, uma parceria minha (informal) com o publicitário e filho do saudoso cineasta, Anselmo Duarte Junior.
Cidadão de Pernambuco, Sagatio, possuía uma empresa de equipamentos de iluminação cinematográfica conhecida como Pirâmide e, até 2011, acumulou 40 anos de atividades na Sétima Arte. Em metade deste tempo, ele foi o grande professor de muitos aspirantes que acabaram se profissionalizando em iluminação de cinema. Ele atuou em períodos importantes que diversos profissionais adorariam ter no currículo, como por exemplo, os anos 1950 - fase que os estúdios da Vera Cruz experimentaram a industrialização do cinema seguindo os padrões perfeccionistas de Hollywood. Em São Paulo, mais precisamente em São Bernardo do Campo, testemunhou o nascimento de muitos astros e estrelas, que só se firmariam, com mais peso, na televisão brasileira (com melhores salários e níveis avançados de bajulação). A década de 1950 marcou o verdadeiro pioneirismo de um cinema que corria contra o tempo em relação ao mercado internacional. Enquanto tínhamos as chanchadas, lá fora, brilhavam produções que pavimentavam o film noir, o neorrealismo italiano e, finalmente, mais tarde, em 1958, a Nouvelle Vague ("Nova Onda", em francês). Entretanto, a preocupação de João Sagatio não era intelectual e sim técnica. E foi assim que ele engrenou iluminando comédias populares como "Jeca Tatu" (1959) e "Zé do Periquito" (1960), ambas estreladas por Amácio Mazzaropi, o maior fenômeno de brilheteria de todos os tempos. Havia hiatos, brechas, quando trabalhava para nomes como Walter Hugo Khouri, especificamente no filme "Na Garganta do Diabo", que considerou, em depoimento, como sua "real" primeira experiência profissional; ou como no ponto alto de sua carreira, quando foi iluminador do grande filme Vencedor do Palma de Ouro em Cannes, "O Pagador de Promessas", dirigido pelo ator e cineasta Anselmo Duarte.
Muitas de suas memórias foram captadas para o um documentário em curta-metragem batizado de "Sagatio: Histórias de Cinema", produzido e dirigido por Amaro Filho, da produtora Página 21. Com cerca de 80 filmes no currículo como técnico em sua área, João Sagatio virou uma lenda viva, passando por diversos cineastas, tais como Joaquim Pedro de Andrade, Eduardo Escorel, Roberto Santos e outros que serão lembrados em breve, neste blog. Também deixou sua marca em muitos filmes populares dos anos 1970, conhecidos como pornochanchadas. Ele foi um ilustre profissional que conviveu com "ilustres artistas", que foram os verdadeiros desbravadores dos desafios de produção. Estes, por sua vez, não possuíam as facilidades tecnológicas encontradas no século XXI, necessitavam tirar leite de pedra. Para se ter uma ideia, ninguém "gravava" filme, era tudo "fotografado", ou seja, o cinema era a fotografia em movimento. Usava-se a expressão "filmar" um filme, diferentemente de hoje que até as câmeras mais amadoras de 1080p oferecem resultados mais praticos que as antigas Super 8 ou 16mm. Evidentemente que os filmes em película sempre serão considerados referências que o cinema digital da Nova Era. E João Sagatio testemunhou todos esses momentos de transformação em nível técnico de iluminação da nossa história.